Por Eduardo Lima, 2006
Sentimo-nos bastante felizes e ao mesmo tempo preocupados quando fomos convidados a escrever este artigo. Isto ocorreu porque discorrer sobre um tema deste significa, antes de tudo, fazer escolhas. Trata-se de um tema múltiplo, extenso, não sendo possível abordá-lo sem recortá-lo. Em suma, não creio que cumpriremos nossa tarefa de modo a satisfazer minimamente nossas pretensões ou de tantos outros que sentirão falta deste ou daquele assunto. Ora, desde o seu nascimento, a Doutrina Espírita esteve solidamente vinculada ao bom senso, à razão, à autocrítica reflexiva e móvel, ao estudo, à comparação, enfim a todos os elementos que compõe algo que pode ser chamado, de fato, e legitimamente, de um conhecimento cientifico; isto, não só naqueles tempos, meados do século XIX, como muitos demonstram brilhantemente; mas, até hoje, a moral cristã espírita anda de mãos dadas com o conhecimento acadêmico. E foi Kardec, que iniciou essa verdade inquestionável. Desta forma, optamos por introduzir rapidamente, e de forma muito simples e pálida, três temas que nos parecem mais apropriados ou urgentes. O cientificismo de Kardec, a crise das ciências atuais e, finalmente, o que tem sido feito atualmente no âmbito cientifico que está, de algum modo, relacionado ao espiritismo.
Já dissemos em nossa introdução, e utilizamos os termos: de fato, e legitimamente, que Kardec quando organizou o Corpo Doutrinário Espírita estava também fazendo ciência. Para os menos céticos, somente o currículo do mestre de Lion, já seria um atestado de que ele, jamais faria livros sem seguir o que seria o método cientifico da época, ou ainda uma rápida visão da história de seus escritos, seria mais do que suficiente para avaliar os altíssimos níveis de critérios metodológicos utilizados por ele em cada sentença, em cada linha. Assim, os que movem batalhas contra estes fatos, muitas vezes movidos até de reais sentimentos de igual amor pela ciência e não somente com paixões, diria menos nobres, precisam conhecê-lo melhor, atentar para esta realidade. Kardec, comparou, refletiu, testou, ponderou e finalmente, a despeito de seu grande ceticismo de juventude, e junto com sua imensa capacidade de fazer ciência e seu enorme bom senso, se convenceu que havia algo fora do comum por trás de todos aqueles fenômenos, uma “inteligência extra”, e isso levou cerca de três anos. Não foi uma decisão apressada ou passional, repetimos, foi uma conclusão lenta, criteriosa, pensada e repensada, talvez até dolorosa, em uma palavra, cientifica. Foi indubitavelmente deste modo que ocorreu.
Não poderia ter sido de outra forma. Nem que ele desejasse.
Kardec estava longe de ser um crédulo, como já supracitado. Ao contrário, antes, ele engrossava as fileiras dos descrentes.
A gênese do Espiritismo, como Doutrina, aconteceu pelas mãos de um homem que é racionalmente inatacável em sua metodologia. Resta-nos saber. A ciência que Kardec produziu serviria para hoje?
A resposta desta pergunta, é forçoso admitir, não é nada simples e está infelizmente longe de ser indubitável. Isso se dá porque, atualmente, vivemos em um mundo em que os teóricos do conhecimento não mais se entendem entre si. Não existe, hoje, portanto, um conceito de ciência universalmente aceito. Longe disso. Não existe acordo, por exemplo, se a obra de Marx, é ou não cientifica, e estamos falando de Karl Marx diga-se; não que eu o considere-o menor que Kardec, ambos foram gigantes.
Ainda na introdução, deste texto informal, utilizamos uma palavra: crise, para descrever o estado das ciências atualmente. Aqui, é claro, o termo não é de nossa lavra, e preferiríamos até que as ciências não estivessem assim, mas reflete bem como estão às diversas epistemologias e até que ponto nós chegamos, sobretudo, nas correntes mais pós-modernas, onde para muitos, o conhecimento só é possível em migalhas, sendo ainda relativo e fadado à morte rápida. Deixaremos para depois seguir estes meandros, que se parecem mais com pântanos, não por falta de desejo e palavras, mas para poupar o leitor menos avisado e tentar ficar nos limites de um jornal. De qualquer forma, nossa resposta para a pergunta é: sim. O que Kardec produziu, jamais poderá deixar de ser considerado uma obra cientifica, mesmo porque, atualmente, em meios aos pântanos já vislumbrados, temos uma opinião quase secreta. Desconfiamos que para muitos, atualmente, o único critério universamente aceito do que seja fazer ciência é o bom senso, e nessa área Kardec era extremante dotado e sua obra reflete em cada linha este fato.
Dentro das fronteiras espíritas, muita coisa está sendo produzida. Grandes pensadores e pesquisadores ampliam mais e mais os limites paradigmáticos da Doutrina continuando com o magnífico trabalho de Kardec. Aqui, entretanto, queremos enfatizar o que acontece “fora” deste espaço. Enquanto pousamos no papel estas linhas, inúmeras pesquisas, não diretamente relacionadas com o espiritismo, estão sendo feitas. E até mesmo, quando não totalmente teorizadas, muitas atividades práticas já circundam nosso cotidiano. Os exemplos da psicologia, das pesquisas psi, e da medicina, são suficientes para demonstrar nosso ponto. Desta forma, tais disciplinas sendo expandidas em ambos os lados uma em direção a outra, mesmo que de forma não intencional, provocarão um encontro que criará como já demonstrado pelos historiadores do conhecimento, novos campos científicos, fruto destas relações intraparadigmáticas. Isso, cremos, trará um maior bem estar social.
Finalmente, terminamos afirmando que, em nossa opinião, diante de todas as pesquisas feitas atualmente, dizer que, de forma conclusiva e cientifica, a maior parte da comunidade acadêmica envolvida em pesquisas próximas ou atividades interdisciplinares, aceita a existência de espíritos, seria ainda precipitado, mas por outro lado e felizmente, aqueles que dizem não existir grandes evidências deste fato não podem mais ser levados a sério. Estão desatualizados das pesquisas e sofrem o risco de serem tachados de pseudo-céticos. Pouca coisa desqualificaria mais.
Eduardo Lima
quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009
Espiritismo e Ciência - Bom Senso
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